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sábado, 15 de outubro de 2011

PAUL CÉZANNE Aix-en-Provence, 1839 – 1906


SERVIÇO EDUCATIVO, 

ASSESSORIA AO PROFESSOR

Aula do Mês - Novembro de 2008

PAUL CÉZANNE
Aix-en-Provence, 1839 – 1906




O Grande Pinheiro
Óleo sobre tela, 89 X 70 cm, 1890-1896.
Acervo do Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand MASP.
Foto: Luis Hossaka
A Obra
Durante a realização da pintura, Cézanne acrescentou à margem superior da tela uma faixa de cerca de 12 centímetros de altura, indicativa da busca do pintor por uma medida proporcional perfeita, comparável à de Poussin. É provável que Cézanne, insatisfeito com o resultado, retomasse pelo menos mais três vezes o trabalho nesta composição (Kostenevitch 1986). A paisagem parece ser a mesma do Grande Pinheiro perto de Aix (São Petersburgo, Ermitage), do Grande Pinheiro e Rochas Vermelhas (Coleção Lecomte, Paris) e da aquarela Estudo de Árvore (Zurique, Kunsthaus).
A datação da obra na literatura crítica é variável. Javorskaya e Reff datam-na entre os anos de 1895 e 1897, Rewald entre 1890-1895 e Cooper entre 1889 e 1891. Provavelmente, foi pintada em Montbriant na propriedade de Conil, cunhado do artista, entre 1892 e 1896 (Camesasca 1979, p. 72 e 1989, p. 118). Para Schapiro, a árvore representada teria sido cara ao artista desde a infância e é citada em uma carta de 1858 a Zola: “Lembra-se do pinheiro plantada à beira do Arc, debruçando sua cabeça de longos cabelos sobre o abismo que se abre aos seus pés? O pinheiro que protegia nossos corpos do calor do sol com seus ramos. Ah! Possam os deuses protegê-lo do machado do lenhador!” Cézanne referiu-se à mesma árvore no seguinte verso de 1863: ”E a árvore sacudida pelo vento furioso, ondula no ar como um corpo imenso/ Seus ramos curvos esfolados flutuam no mistral”.
Segundo Schapiro, domina neste quadro uma concepção lírica na qual a árvore é representada como uma individualidade heróica, expressa em cada parte, desde o tronco torturado, porém vigoroso como nenhum outro, até os galhos e as folhas que quase alcançam o céu. Cézanne tende, nesta fase de sua vida, a uma solidez homogênea e sintética, que o artista alcança através da fluida e transparente fusão das cores. Suas árvores, em vez da forma maciça das colunas, assumem um relevo mais profundo, com seus ramos caídos e ondulantes. A composição merece ser considerada em si mesma. Em nenhum outro de seus quadros a paisagem evidencia tamanha independência em relação à tradição anterior. Talvez a obra de Theodore Rousseau, Diário do Verão (Paris, Louvre), possa ser considerada sua predecessora, porém de forma muito distante, inclusive em relação à iconografia. Pelo menos numa ocasião, em Neve ao Sol em Fontainebleau (Nova York, Museum of Modern Art), Cézanne usou uma fotografia encontrada em seu ateliê após sua morte, como fonte de inspiração. Camesasca (1989, p. 120) sugere que, para a realização do quadro do Masp, Cézanne tenha usado um calotipo feito por Fox Talbot em 1840, hoje guardado no London Science Museum.
O Artista
Filho de um banqueiro, cresceu numa rica família burguesa. Estudou no Collège Bourbon de Aix, onde se tornou amigo de Émile Zola, amizade que perdurou longamente. Após terminar os estudos de Direito, viajou, em 1861, pela primeira vez a Paris, onde freqüentou o Louvre para copiar grandes pintores venezianos e holandeses, mas sobretudo Velásquez e Caravaggio. Voltou a Aix e começou a trabalhar no banco do pai, mas em novembro de 1862 estava já novamente em Paris, onde compareceu ao Salon des Refusés, admirou a pintura de Delacroix e de Courbet e conheceu Pissarro, que devia contribuir em muito para sua orientação artística. De Aix, onde se instalara a partir de 1864, começou a enviar aos Salons oficiais obras que foram sempre rejeitadas. Nas estadas em Paris, sempre mais freqüentes, estreitou relações com os artistas do futuro grupo dos impressionistas e com os intelectuais e artistas que se reuniam na casa de Zola. A solidez construtiva de Courbet e o lirismo cromático de Delacroix tiveram grande importância nesta primeira fase da arte de Cézanne, também chamada de “romântica”. Daumier foi igualmente importante e a nova pintura de Manet, por quem Cézanne nutria grande admiração, não correspondida. Os quadros realizados entre 1865 e 1869 evidenciam a reflexão do artista sobre estes modelos (Nouvelle Olympia, A Pêndula Preta, 1869-1870, Paris, coleção Niarchos; Paul Alexis Lendo um Manuscrito a Zola, 1869-1870, São Paulo, Masp ).
Com a guerra franco-prussiana de 1870, Cézanne mudou-se definitivamente para Aix e depois para L’Estaque, na baía de Marselha. Estimulado pelas pesquisas de Pissarro, eliminou o elemento narrativo das suas pinturas para reconstruir de modo sintético a percepção ótica subjetiva da realidade (A Casa do Enforcado, 1873, Paris, Musée d’Orsay). Em 1874 e em 1877, participou, sem sucesso, das exposições dos impressionistas no ateliê de Nadar. As obras desta fase, caracterizadas por cores mais claras e uma ordem compositiva mais severa, evidenciam a distância de Cézanne em relação ao impressionismo, patente em sua intenção, declarada, de “solidificar o impressionismo”, isto é, de transformar a vibração da superfície cromática em definição do volume, na busca de uma síntese formal que identificasse os elementos básicos da linguagem da pintura. Nas obras realizadas em Aix, entre 1883 e 1887, o controle formal na reconstituição das percepções torna-se ainda mais rigoroso. A cor transforma-se na síntese de tom e de espaço, as formas são aproximadas a uma geometria essencial, o cone, a pirâmide, o cubo, a esfera, que se identificam com a construção do espaço por parte da consciência.
Em 1886, Cézanne rompeu com Zola, reconhecendo a si próprio na figura do pintor fracassado Claude Lautier, protagonista do romance A Obra, publicado naquele ano. Foi o começo de um progressivo isolamento, que o levou a se concentrar ainda mais na própria pesquisa artística. O sonho do pintor era elevar a uma dimensão clássica e monumental o novo sistema de valores inaugurado pela pintura impressionista, “refazer Poussin a partir da natureza”, baseado na “petite sensation”, reconstruída com dedicação incansável. Por isso, retornou constantemente aos mesmos temas: vistas de L'Estaque e, sobretudo da montanha Sainte-Victoire, naturezas-mortas, retratos da mulher. No último período de sua atividade, Cézanne realizou muitas composições de banhistas, até atingir dimensões monumentais (Merion, Barnes Foundation; Filadélfia, Museum of Art; Londres, National Gallery) e num grau de abstração cada vez mais acentuado. A partir do Salon des Independants de 1899, o interesse pela pintura de Cézanne, antes restrito a uns poucos colegas pintores, foi crescendo. Em 1904, o Salon d' Automne reservou uma sala ao pintor e, em 1907, foi realizada uma grande retrospectiva póstuma de suas obras. Naquele ano, Picasso pintava as Demoiselles d’Avignon e Braque irá se instalar em L’Estaque para pintar algumas paisagens que afirmam a presença de Cézanne nas raízes do movimento cubista. De fato, toda a arte contemporânea deve à Cézanne o conceito de autonomia da forma e sua independência em relação aos dados naturais ou emocionais.
Luciano Migliaccio
Texto extraído do
Catálogo do Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand: Arte Francesa
Coordenação geral: Luiz Marques 
São Paulo, Editora Prêmio, 1998.


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